terça-feira, 27 de maio de 2014

AULA 03

AULA 03/2014

Tema: Entrada e receita. Receitas públicas (classificações). Receitas originárias e derivadas.

1. Síntese dos problemas relevantes: A aula anterior expôs entre outros, dois temas de grande relevância:

a) a complexidade da tarefa de se concretizar todos os direitos fundamentais de modo universal e em níveis que sejam suficientes ao desenvolvimento digno da vida, em uma realidade de escassez de recursos financeiros;
b) a necessidade de se reconhecer as limitações que a natureza dos direitos relacionados ao bem-estar e à dignidade de vida impõem à satisfação universal e instantânea das prestações e dos benefícios existenciais que sejam essenciais ao desenvolvimento da vida.

Diante desses problemas, cumpre avançarmos um pouco mais na compreensão sobre as dificuldades relacionadas à garantia (pelo Estado) das condições essenciais ao desenvolvimento digno da vida.
O objetivo é, primeiro, reforçar a distinção entre as necessidades públicas (que derivam de tarefas de proteção) e as prioridades públicas. Em segundo lugar, enfatizar que a definição da intensidade com que as necessidades serão protegidas envolve um juízo sobre a disponibilidade de recursos e sobre um determinado contexto social, econômico e cultural.
Tomemos o seguinte exemplo: Mesmo se for considerado o contexto europeu, o desafio do aperfeiçoamento das redes de proteção social não é menor ou menos complexo do que aquele experimentado na realidade brasileira. Se nesta realidade os níveis essenciais de prestações existenciais ainda precisam ser atingidos, naquela o desafio de se assegurar o nível que naquele contexto o Estado tenha se comprometido com a comunidade e com a ordem social requer a convergência e o êxito de diversas variáveis. Note-se, v.g, em primeiro lugar, que a proteção social envolve elevados custos por iniciativa do Estado no plano da saúde, economia, cultura, meio ambiente, educação, trabalho, entre outros. O êxito da tarefa de se proporcionar os níveis suficientes nesse plano, e para todos, envolve um juízo sobre as taxas de natalidade, um contexto econômico favorável ao desenvolvimento e à geração de recursos econômicos em benefício do Estado, e a existência de condições favoráveis à inserção da população economicamente ativa no mercado de trabalho. A falha na garantia de condições favoráveis sobre qualquer uma dessas realidades compromete a possibilidade de se proporcionar a tarefa universal de proteção a todos os direitos fundamentais, porque, assim como na realidade nacional, ter-se-á o mesmo desafio: como assegurar proteção coletiva em um contexto em que os recursos são escassos?
Esse desafio coloca um problema de maior gravidade para as prestações no domínio de um direito fundamental à saúde, porque, se por um lado realizar todos os direitos fundamentais somente seria razoavelmente possível e exigível sob uma noção de nível mínimo de prestações, de um mínimo existencial e de uma cláusula de progresso (a cláusula de progressividade na proteção dos direitos sociais, econômicos e culturais), a falha na correta destinação dos recursos é mais nociva ao interesse público em razão de comprometer o próprio direito à vida de uma universalidade. Se é possível que a comunidade possa aguardar o aperfeiçoamento dos níveis de proteção no plano da cultura, talvez no plano da educação (sua ausência nos níveis essenciais pode ser nociva para o desenvolvimento de uma nação e das instituições democráticas, favorecendo a formação de um ambiente que estimule a corrupção pública e política), da ciência e da tecnologia, da economia, não o seria no plano da saúde. Aguardar-se o aperfeiçoamento das prestações de saúde pode resultar na permanência e no aumento dos estados de risco coletivo à vida humana.
Nesta realidade, é possível visualizar um difícil paradoxo: se nem todos os direitos fundamentais podem ser concretizados com a mesma intensidade e de forma instantânea (somente sendo possível sua proteção progressiva, que favoreça a melhoria permanente), admitir uma cláusula de progresso no plano de um direito à saúde poderia conduzir a um resultado negativo e indesejável, porque, neste caso, a demora na concretização pode não apenas degradar a existência humana, senão eliminá-la, não sendo esta, naturalmente, uma ação compatível com os objetivos de um Estado socioambiental.
Assim analisado o problema, podemos reforçar o que foi desenvolvido na aula anterior e, assim, prosseguirmos com o tema desta aula: se os direitos fundamentais somente podem ser protegidos sob uma abordagem de progressividade, seu desenvolvimento requer a definição de um nível mínimo de proteção que nunca poderá ser mitigado, eliminado, ou ignorado pela ação estatal.
Portanto, quando tratamos de uma noção de mínimo existencial, ou de nível essencial de prestações, não se supõe que não está atribuído ao Estado um dever de aperfeiçoamento dessa proteção. Somente por meio dessa melhoria permanente, será possível permitir que as prestações alcancem toda a universalidade, que se encontra em permanente incremento numérico. Por outro lado, a admissão de uma cláusula de progressividade não pode ser compreendida independentemente de uma noção de mínimo existencial ou de nível mínimo de prestações. Somente se concebe progressividade a partir de proteção de níveis essenciais à existência, e a proteção de níveis essencias de existência requer permanente melhoria (progressividade). São definições interdependentes e indivisíveis, que precisam estabelecer interação, sob pena de se obter proteção deficiente dos diversos direitos fundamentais e sob pena de se inviabilizar a tarefa estatal de proteção da vida digna (projetos de).
A partir desse contexto podemos recuperar alguns conceitos de nossas primeiras aulas.
Partimos de uma relação que representa a atividade financeira do Estado, ou melhor, as relações vinculadas a essa atividade financeira: receita, despesa, e necessidades públicas, de forma planejada, através de um instrumento denominado orçamento, e segundo regras e princípios que orientam como necessidades públicas que devem ser asseguradas por iniciativa do Estado.
Todos os entes da federação desenvolvem atividade financeria, todos os entes devem assegurar prestações materiais de acordo com o que propõe a Constituição nos artigos 20, 25 e 30, mas nem todos desenvolvem atividade legislativa referente à organização da atividade financeira.
O município regula os seus próprios serviços, define as prioridades concretas e como e em que medida seus recursos serão empregados para atendê-las. Entretanto, normas gerais e normas de detalhamento sobre o exercício da atividade financeira estão reservadas à União, Estados-membros e Distrito Federal. Só estes entes estão arrolados no conjunto de competências ditas concorrentes.
Entretanto, é conveniente salientar que a Constituição também propõe em seu artigo 30, inciso II, a capacidade de suplementação legislativa, atribuída aos municípios, sobre a legislação federal e estadual, razão pela qual a doutrina também costuma reconhecer neste dispositivo autorização para que os entes municipais também legislem sobre matéria financeira.
Qual é a diferença entre o regime de competência concorrente (que também define competências supletivas) para a suplementação autorizada pela Constituição para os municípios, por meio de seu artigo 30, inciso II? Notem que o artigo 24 apenas especifica algumas MATÉRIAS. Só tais MATÉRIAS podem ser objeto de atuação cooperada entre ESSES entes. OUTRAS matérias (como aquelas que estão reservadas aos Municípios) estão excluídas dessa possibilidade. Se a suplementação existe, o fundamento é outro. Está em competência própria do Município, decorrente de expressa atribuição constitucional. Podem complementar, mas só podem fazê-lo em tudo o que for de seu exclusivo interesse local e pressupondo, portanto, pré-existência de regra da União, ou de regra dos Estados-membros ou do Distrito Federal. Só se tem complementação de algo que já existe. Suplementação remete à supletividade. E esta só está autorizada no plano das competências concorrentes, excluindo, portanto, os Municípios.
Feito isto, passemos à análise do primeiro elemento da relação jurídica que qualifica o exercício da atividade financeira do Estado: a receita pública.
Vamos analisar hoje o conceito de receita (receita pública), diferenciá-la de outro conceito, o de entrada, e concluiremos com uma classificação inicial, que distingue duas espécies de receita. As originárias e derivadas.

Marcos normativos: Lei n. 4.320/1964 e LC n. 101/2000;

A norma geral de Direito financeiro: artigo 1º, da Lei n. 4.320/1964:
Art. 1º Esta lei estatui normas gerais de direito financeiro para elaboração e controle dos orçamentos e balanços da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal, de acordo com o disposto no art. 5º, inciso XV, letra b, da Constituição Federal.”

Conceito de responsabilidade fiscal: equilíbrio na gestão fiscal, gestão da atividade financeira do Estado;

Art. 1º Esta Lei Complementar estabelece normas de finanças públicas voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal, com amparo no Capítulo II do Título VI da Constituição.
§1 A responsabilidade na gestão fiscal pressupõe a ação planejada e transparente, em que se previnem riscos e corrigem desvios capazes de afetar o equilíbrio das contas públicas, mediante o cumprimento de metas de resultados entre receitas e despesas e a obediência a limites e condições no que tange a renúncia de receita, geração de despesas com pessoal, da seguridade social e outras, dívidas consolidada e mobiliária, operações de crédito, inclusive por antecipação de receita, concessão de garantia e inscrição em Restos a Pagar.
              Uma digressão sobre a atividade de responsabilidade fiscal, apenas para que situemos do que se trata:

Descrição da relação jurídica que organiza a atividade financeira:

a) Obtenção de recursos (fontes);
b) Decisão/escolha sobre a destinação dos recursos, a qual envolve a conversão das necessidades públicas em prioridades públicas. Estas representam, em última análise, uma decisão sobre a proteção de um conjunto de direitos fundamentais, atribuindo maior ou menor proteção a determinados direitos, estipulando os graus e níveis de proteção e os destinatários da proteção;
c) Controle: atividade que deve ser situada sob uma referência de eficiência nos gastos, além da adequação da própria decisão que priorizou a despesa em detrimento de outras.

IMPORTANTE: Não é suficiente obter dinheiro (receita) e aplicar o recurso público (receita) em alguma atividade, mesmo que seja uma atividade obrigatória sob a ótica da Constituição (despesa).
Cite-se o exemplo da educação: 35% da receita pública de um determinado município deve ser aplicado em despesas relacionadas à educação: o que se faz então? Construção e ampliação de estrutura física das escolas, aquisição de material, construção de laboratórios de informática. Pergunta-se: o que interessa nesse processo? Que o serviço público, a necessidade existencial “acesso à educação” seja satisfeita; ou, em última palavra: que seja produzido ensino básico de qualidade. Como isso é aferido?  Em avaliações.
Então o que interessa na prática? Aplicar o dinheiro de forma automática ou garantir que   exista efetivamente acesso à educação de qualidade? O problema é que ainda não se tem um sistema de controle baseado em metas sob o princípio constitucional da eficiência.
Uma decisão ou escolha sobre uma determinada diretriz de política pública implica, necessariamente, a justificação de uma despesa que será programada em um orçamento anual e resultará em uma ação concreta, mediante a previsão das metas e diretrizes traçadas anteriormente. É a decisão pública ou política que justificará a alocação dos recursos e justificará uma despesa concreta que será realizada. Exemplificando no plano da definição de uma determinada política ou ação pública, relacionada aqui à educação ambiental. Quando são analisadas ou expostas à consideração de uma autoridade política, para o fim de determinar que prioridades, metas ou diretrizes deverão ser atingidas, na condição de prioridade, está se fixando que, através do uso de recursos públicos, aquelas metas foram escolhidas como as melhores que estavam disponíveis, para se atingir com objetivo, a formação de uma consciencia ambiental, cultural e cidadã.
O uso dos recursos públicos e a geração da despesa deve sempre ser otimizado. Deve-se buscar atingir o melhor uso que seja possível e permitido para aquele recurso público, para atingir as metas traçadas.

Pergunta-se: traçar como meta de educação ambiental educar as pessoas para que joguem lixo em lugares adequados é suficiente para a formação de pessoas ou cidadãos com consciência ambiental?
No plano concreto, fixar como meta a elaboração de programas de educação baseadas nessa orientação e instalação de cestas coletoras de lixo ou seletivas, representa o melhor uso daquele recurso público para atingir o objetivo, educação ambiental. Ou o de educar pessoas para que, de forma consciente, possam se posicionar perante os particulares e os poderes públicos, exigindo condições de vida digna, que incluam a variável ambiental?
A resposta pode surgir do seguinte exemplo: foram instaladas, com base em um programa fictício dessa natureza, várias cestas coletoras de lixo. As pessoas foram ensinadas a jogar lixo em tais cestas. O município, entretanto, não contrata ou não estabelece em seu edital de licitação, a exigência de que a licitante, para ser vencedora, atenda exigências de coleta e transporte seletivo. Resultado: o lixo é compactado e destinado a um aterro sanitário, onde não poderá ser separado e reaproveitado.
Isso representa um gasto eficiente?

Alternativa: política pública deve procurar atribuir ao recurso público, meios para que atendam da melhor forma possível a meta pública traçada como prioridade. No caso em comento, ainda pode ser citada a possibilidade de se utilizar a coleta e transporte seletivos, integrados a projetos de seleção e reciclagem de resíduos, como formas de economia de recursos públicos no tratamento de resíduos, que diminuem, e de inclusão social, reduzindo gastos com programas públicos de assistência social e com a necessidade de destinação e tratamento daqueles resíduos, que deixam de ser despesas para representar a possibilidade de investimento em outras prioridades públicas.
Exemplos que descrevem o cenário oposto:
a)   Reparo de cobertura asfáltica em períodos de chuva;
b)  Aplicação do percentual de 35% de recursos municipais em ações de ensino, da qual resulta o aumento nas taxas de analfabetismo no município;
c) Estados de calamidade pública decorrentes do aumento dos focos de contaminação de dengue;
d) Estados de calamidade pública decorrentes do aumento de chuvas nos grandes centros urbanos;
e)   A proposição de alternativas viárias por tentativa e erro;

Recapitulando: De que relação estamos falando? Primeiro de uma relação, aquela que depende da iniciativa do Estado, através de União, Estados-membros, Distrito Federal e dos Municípios, arrecadando para atender prestações essenciais, básicas e indispensáveis para permitir que possamos usufruir de realidades existenciais mínimas. O que é isso? Mínimo existencial, ou como aponta o professor Ricardo Lobo Torres (2002), mínimos existenciais, de diversas ordens e naturezas. Temos também uma segunda relação, que é consequência ou efeito da primeira, que supõe obrigações da coletividade perante cada um daqueles entes, entregando dinheiro, que se converterá em recursos públicos, que, por sua vez, serão empregados no atendimento de cada uma daquelas tarefas que descrevemos a vocês na aula anterior. A primeira relação é de Direito financeiro. A segunda relação também interessa ao Direito financeiro, mas não é de Direito financeiro. É de Direito tributário. Por que ela interessa à nossa disciplina? O foco é apenas sobre o efeito daquela obrigação, porque dela se obtém o que? Receita. Receita pública. E daí teremos o início da relação que define a atividade financeira do Estado. Receita, despesa e necessidades públicas.
Conforme dissemos na primeira aula, quando tratamos das formas de Estado, não podemos analisar qualquer um desses elementos da equação, sem antes definir de que modelo de Estado estamos falando. Não é um Estado liberal, nem um Estado social, mas um Estado social e democrático de Direito, que tem como base, uma economia capitalista, donde o Estado é a sua forma jurídica e que deve atender um extenso conjunto de necessidades, na forma de prestações.
Como elas são atendidas? Em geral, mediante a entrega de dinheiro ao Estado, e, basicamente, através de IMPOSTOS, que conforme vamos conferir na próxima aula, trata-se hoje de uma espécie de receita, a tributária.
Esta espécie de receita tem origem naquela segunda relação de que tratamos.
O Estado intervém diretamente sobre o patrimônio do particular (não se trata aqui de intervenção no domínio econômico, que é outra coisa. Intervenção no domínio econômico tem a ver com a entrada do Estado, explorando diretamente atividade econômica, comportamento que, preferencialmente, deve estar concentrado na iniciativa do particular. É o particular quem explora, apropria-se e desenvolve atividade econômica. É ele também quem toma decisões econômicas. E o que seriam as decisões econômicas? Decisões sobre o que explorar, sobre como explorar e de que forma explorar. Não há planejamento neste sentido. Planejamento, como vimos, é atividade do Estado para suas próprias atividades.
O Estado, em uma economia capitalista, não pode vincular, obrigar, dizer ao particular o que ele deve produzir, de que forma e em que setor deve atuar. Isto está, conforme dissemos, nos artigos 170 e 174 de nossa Constituição.
No Estado social, democrático (e ambiental) de direito, custear aquele extenso conjunto de prestações depende de um conjunto muito maior de fontes (vamos tratar deste modo, por enquanto). Apenas tributos não atendem tais atividades. Por tal razão, quando investigamos as fontes que permitem o custeio das necessidades públicas,.
Vamos tratar agora do conceito de receita pública, que aponta antes para a entrada (ingresso) de qualquer espécie de dinheiro, independente do título e de sua causa, no patrimônio público.

2. Entradas e receitas.
Temos aqui um primeiro problema para o conceito: se receita é a entrada de dinheiro no patrimônio público, o que é entrada?
Entrada é o ingresso de qualquer espécie de dinheiro, independente do título e de sua causa, no patrimônio público. Elas podem ser provisórias ou definitivas. Nem toda entrada é receita pública.
Por que isto? Pensemos em depósitos de garantias de contratos públicos que devem ser devolvidos ao contratado após o término da contratação, ou de empréstimos compulsórios (que vamos tratar depois), no qual o Poder Público se vale de captação de dinheiro do particular (que não pode se recusar a oferecê-lo, conforme artigo 165, § 8º da CF/88) e deve devolvê-lo posteriormente.
Nas duas situações há ingresso, mas não é permanente. O dinheiro arrecadado não ingressa definitivamente, permanentemente, no patrimônio público. Não pode dispor e contar com tais recursos para atender as necessidades públicas. Isto é entrada. Ingresso provisório de recursos no patrimônio público.
De outro lado, temos as entradas que são definitivas. Estas sim, integram permanentemente o patrimônio público. Estas resultam de um ato de imposição do Estado perante o particular, relacionado ou não a uma prestação perante aquele, podendo resultar de sanções ou de execução de serviço público. Aqui estão os tributos, que são impostos, taxas, contribuições de melhoria (artigo 3º, do CTN) e multas.
Receitas públicas são entradas, mas entradas definitivas, ou seja, somente aquelas que pressupõem o ingresso de dinheiro, de forma permanente, no patrimônio público.

3. Classificação das receitas.
3.1 As receitas ordinárias e as extraordinárias.
Há algumas classificações relevantes utilizadas pela doutrina. Citemos, por exemplo, entre receitas ordinárias e extraordinárias. As primeiras têm origem no desenvolvimento da atividade ordinária de Estado, tendo como principais exemplos, a receita obtida de multas, exploração direta de serviços públicos, aluguéis de imóveis de sua propriedade e tributos.
As extraordinárias são entradas definitivas, permanentes, mas estão relacionadas a causas excepcionais, destinadas a fazer frente a estados de anormalidade institucional. O principal exemplo está nos impostos extraordinários, indicados no artigo 154, inciso II, da CRFB. Notem que, neste caso, o ingresso é permanente, depende de uma situação anormal para a sua EXISTÊNCIA, e deve ser suprimido imediatamente após a cessação da causa que justificou a CRIAÇÃO dessa modalidade de RECEITA.

3.2 Receitas originárias, derivadas e transferidas.
A classificação de maior relevância, por ser esta a que se encontra definida no artigo 9º, da Lei n. 4.320/1964, e que também foi considerada pela LC n. 101/2000, é a que distingue as receitas originárias, das receitas derivadas e transferidas.
Qual é o fundamento dessa classificação? É a fonte, a origem da obtenção do recurso.
As receitas originárias têm causa na exploração de seu próprio patrimônio, ou ainda, quaisquer receitas que não possam ser situadas sob a condição de   derivadas. O dinheiro sempre advém da transferência de recursos que têm origem no patrimônio de particular para o público. Mas não há aqui ação constritiva, imposição, obrigação sobre a ação do particular. O dinheiro resulta da exploração pelo próprio Poder Público, ou de particulares, de seus bens e serviços. Temos aqui o caso dos aluguéis de seus imóveis, aquelas resultantes da exploração do monopólio, os serviços públicos exp lorados diretamente pelo Estado, os recursos oriundos de contraprestação paga pelo particular, para acesso a imóveis públicos (museus, exposições, etc...).
Nas receitas originárias, quando temos uma contraprestação do particular perante uma prestação do Poder Público, em uma relação negocial, o que se paga para o Estado é um preço, preço público. Não é taxa porque não resulta de imposição estatal, e não é tarifa porque não tem origem na exploração dos serviços do Estado pelos particulares, nas atividades de concessão, permissão e autorização.

3.3 Exemplos de receitas originárias:
a) doações (bens ou valores que ingressam definitivamente no patrimônio público): artigo 538 a 546, do CC/02;
b) sucessão legítima: artigo 1844, CC/02;
c) herança vacante: artigo 1820 a 1822, do CC/02.
No segundo caso, das receitas derivadas, o que temos é: transferência de patrimônio particular para o público de forma obrigatória, impositiva. Trata-se do caso da atividade tributária: impostos, taxas, contribuições de melhoria, e das multas.
Na última espécie de classificação, temos as receitas transferidas, nas quais a situação é a seguinte: continuamos a ter a transferência de recursos do patrimônio particular para o público. Esta transferência não é voluntária, é obrigatória. Mas quem arrecada não utiliza ou tem acesso pleno ao conjunto da receita arrecadada. Arrecada e transfere parcialmente o resultado desta atividade, para outra pessoa jurídica pública. Estamos no âmbito dos tributos e da repartição dos recursos entre vários entes da federação, aspecto que se encontra vinculado ao tema da repartição da receita tributária, exposto ao longo do artigo 157 a 162, da CRFB.

3.4 Exemplos mais comuns:
a) IR, instituído pela União, mas repartido entre Distrito federal e Estados quando retido na fonte. Aos Municípios, o retido na fonte sobre os rendimentos que ele paga;
b) IPVA: instituído pelos Estados e repartido entre os Municípios;
c) ITR: instituído pelos Estados e repartido com os Municípios;
d) ICMS: instituído pelos Estados e repartido com os Municípios;
e) Impostos do artigo 154, inciso I: 20% para os Estados e Distrito federal;
Todas essas receitas são receitas transferidas tributárias, uma outra espécie de classificação, com a qual vamos trabalhar a partir da próxima aula: tributárias e não tributárias.

OBSERVAÇÃO: artigo 160, da CRFB de 1988: proibição de retenção ou restrição de entradas e ao emprego dos recursos que são atribuídos aos Estados, Distrito federal e municípios, salvo para pagar os créditos da União e dos Estados perante o ente devedor, e o repasse de recursos para as atividades de saúde;
O que isso significa? Pode a União ou o Estado não repassar os recursos? Pode reter? Resposta: Pode condicionar, e é isso que conta do texto do Parágrafo Único do artigo 160, de modo que, pode submeter o Estado ou o município à obrigação de alocar em sua proposta orçamentária para que possa receber tais recursos, mas nunca reter sem causa e justificação prévia.
Mas as receitas transferidas não se resumem a receitas tributárias. Podemos ter também, receitas não tributárias, como é o caso daquelas que estão no artigo 20, § 1º da CFRB, relativas a participação no resultado da exploração de petróleo, gás natural ou de recursos hídricos para o fim de geração de energia elétrica, ou de recursos minerais, e relativas à compensação financeira por essa exploração.
O que é a participação e a compensação de que tratam esse dispositivo?Todos esses recursos são bens da União. Mas estão distribuídos no território de Estados-membros e municípios. O particular que explore os recursos ou a própria União, deverá assegurar a destinação de parte de seus lucros a esses entes. E o simples fato de explorar já dá causa à compensação financeira.

4. Receita Pública e a LC n. 101/2000:
Arrecadar dinheiro através da fixação de tributos é obrigação de cada ente da federação, no âmbito de sua competência legislativa (artigo 11, caput). Portanto a obrigação nessa perspectiva é dupla. Se o particular tem a obrigação de entregar dinheiro ao ente público, este não pode deixar de exigir essa prestação do particular. DEVE arrecadar, deve exercer sua competência tributária. Não exercê-la é crime do gestor público. Do prefeito, do governador e do presidente da República;
Disso também deriva outra consequência muito relevante. Lembremo-nos das transferências voluntárias, que são aquelas relacionadas à ajuda institucional de um ente para o outro. Não pode doar um veículo para outro, ou instrumentos para execução de suas necessidades públicas, se o ente não instituiu os impostos de sua competência. Se o município de Cuiabá não instituiu, portanto, o IPTU progressivo, não poderia receber da União ou do Estado dinheiro e recursos para fazer frente ao combate aos efeitos das enchentes, por exemplo.
Outra situação distinta é o ente estadual renunciar a receita que lhe caiba. Nesta, ele abdica de parte de sua arrecadação. Muito comum em relação ao ICMS, para incentivar a instalação de complexos industriais, e com o IPTU, no caso do município, para favorecer o mesmo objetivo. Isso gera a chamada guerra fiscal. Vamos analisar ao fim da disciplina no tópico específico para a Lei de Responsabildiade Fiscal (LRF). Basta, por enquanto, sabermos que o artigo 14,caput, da LRF autoriza, mas deve prever antes o impacto que isto vai gerar em seu orçamento no exercício em que terá vigência, além dos dois seguintes.

Em síntese:
Atividade financeira do Estado tem como objetivo a análise de como se desenvolve a atividade pública prestacional destinada a assegurar a manutenção e o desenvolvimento de mínimos existenciais, que se refletem, em grande medida, em serviços públicos, mas não apenas e não necessariamente em serviços públicos. Estruturas públicas, prestações materiais, tudo isto depende do exercício da atividade financeira do Estado. Atividade pública. Esta consiste em que, especificamente? Como estas prestações são possíveis?
Destaca-se aqui, o primeiro elemento da relação jurídica vinculada ao exercício da atividade financeira do Estado: o estudo e a análise da receita pública.

PORTANTO, temos em síntese que: nem toda entrada é receita pública. Já identificamos a possibilidade de ingresso por meio de tributos, ou por outras formas voluntárias, mas há um conjunto extenso de outras modalidades. Citemos apenas a das indenizações. Tudo o que tiver origem em danos ao patrimônio público, ou de recuperação de despesas que foram realizadas em caráter supletivo à ação do particular, não constitui receita originária, nem derivada, nem transferida. Também não é tarifa ou preço público (que vamos analisar em comparação com as taxas e na aula destinada a receita tributária). Nesse caso, o dinheiro que ingressa (e será também de forma permanente), o faz como indenização.
O que interessa desta argumentação? Temos aqui mais um item que identifica o conceito de receita. Só é receita aquilo que represente um incremento ou acréscimo patrimonial para o Estado (variação positiva do patrimônio público). Quando ele recompõe uma despesa que efetuou, ou quando exige perante um particular a reparação pecuniária diante de um dano que este produziu perante seu patrimônio, não há aumento de patrimônio, mas estabilização.
O que temos aqui, portanto? Temos atividade financeira do Estado? Não. Temos receita pública? Não. Temos o que se convencionou tratar por movimento de caixa.

5. Indicações bibliográficas
CONTI, José Mauricio. (Coord.). Orçamentos públicos. A Lei 4.320/1964 comentada. São Paulo: RT, 2008.
CREPALDI, Sílvio et al. Direito financeiro: teoria e prática. Rio de Janeiro: Forense, 2009.
FURTADO, J. R. Caldas. Elementos de direito financeiro. Belo Horizonte: Fórum, 2009.
OLIVEIRA, Régis Fernandes de. Curso de direito financeiro. São Paulo: RT, 2006.
PINTO, Antônio Luiz de Toledo et al. Código Tributário, Processo Civil e Constituição Federal. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.
TORRES, Ricardo Lobo. Curso de direito financeiro e tributário. 9. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2002.